27 de ago. de 2007

A Bolsa de Valores e a Ética Capitalista

Por Laurence Bittencourt Leite

A ética capitalista não é a católica e sim a protestante. Essa não é a idéia sociológica central, bem entendido, construída por Max Weber(foto). Sua idéia parte do que ele chamou de “espírito” do capitalismo associado a uma certa ética e prática protestante, o que é diferente de falar em uma “ética” capitalista. Mas há uma ética capitalista sim.
Weber - ao contrario de Karl Marx que pensou o capitalismo e as relações sociais dentro de uma visão de poder baseado na infra-estrutura econômica -, privilegiou uma leitura do capitalismo moderno ligado a questões da superestrutura. Se Marx partiu de uma base material para a compreensão da ideologia, Weber parte da ideologia para explicar o universo econômico. Mas, volto a repetir, é possível sim, se falar em uma ética capitalista e nesse caso ela também não é extraída da religião católica. A ética católica, entre outras coisas, teria um quê de hipocrisia, tendo em vista que sempre foi detentora de grandes fortunas e terras, ainda que fazendo o discurso condenatório das posses. Iguais aos políticos da América Latina, percebam. Além disso a ética protestante não pressupõe, como a católica, uma idéia de salvação mediada e permitida por um padre, que distribui a graça de modo eficaz e ao seu bem prazer, e sim a funda na idéia de salvação pessoal, baseada não em poderes mágicos, mas em trabalho. A idéia da dependência criada pelos primeiros padres como detentores da salvação alheia, lembra também os políticos na América Latina, que criam a dependência para a partir daí “fazer chegar” a salvação a cada eleitor.
É incrível também, para quem gosta dessas questões, perceber por trás da ética protestante uma relação de proximidade com o judaísmo, e nem é preciso ir muito longe, bastando associar a aceitação do casamento pelo pastor protestante (aceita também no judaísmo) como também o não cultivo de imagens sagradas.
No entanto, e aqui acho eu que é o traço mais interessante, é perceber novamente nessa relação entre o espírito do capitalismo e a ética protestante uma não negação e condenação do mundo físico, que é também a tese defendida por Nietzsche, ao ver na moral cristã as causas do atraso e miséria (que ele chamou de niilismo) modernas. Nietzsche, claro, irá defender a origem do repúdio ao mundo social externo, a uma tradição iniciada com Platão e sua rejeição ao mundo físico, corporal, visto como ilusório, ao qual se liga posteriormente a moral cristã com a condenação pecaminosa do corpo. A redenção de um vazio existencial para Platão estaria condicionada a um outro lugar, um paraíso, cuja finalidade seria uma bondade sem fim. O embrião da vida como um vale de lágrimas tendo como contrapartida um local (não terreno) de bem eterno, extrai sua força já na filosofia platônica. Não é à toa que o filósofo irá pensar uma cidade ideal, modelo, da mesma forma que Thomas Mores irá fazer com sua “Utopia”, e os socialistas com o “sistema social comunista”. Pode-se também sem grandes esforços, perceber a mesma diretriz nos desejos de Hitler com sua exclusão ao estrangeiro e um purismo ariano na terra. Percebam que todos têm em comum o traço de repúdio a democracia e ao capitalismo. Essa é a ética da América Latina, posso dizer.
O espírito capitalista moderno, segundo Weber, liga a idéia de realização material a uma vontade divina, ou seja, a um desejo de Deus, coisa negada pela ética católica. Para os calvinistas por exemplo, “ficar rico” materialmente, seria uma “prova” de que se é amado por Deus. Já a idéia católica (hipocritamente lançado ao mundo) é a da condenação do dinheiro, da usura, sendo um gravíssimo pecado (para os outros bem entendido) e por isso condenado. Capitalismo e Igreja católica jamais comungaram a mesma idéia. Não é à toa que o sistema econômico aceito pelo catolicismo foi o feudalismo, o mesmo que rege a América Latina até hoje. Mas há outras questões. No capitalismo moderno está implícita a idéia de confiança no outro, algo totalmente impensado nos regimes socialistas. E sem confiança não há capitalismo. Isso é fácil de ver por exemplo no surgimento das Bolsas de Valores, criadas pelos judeus.
O que é uma Bolsa de Valores? Um mecanismo, cuja criação na origem, pressupõe que alguém que tem uma empresa e quer expandir seu negócio e que não tem capital suficiente, ao invés de tomar dinheiro emprestado a um Banco para não pagar juros, ou pedir ao governo, passar a colocar no mercado papeis chamados de “ações”. A única garantia que o comprador dos papeis tem é uma confiança que o dono da empresa irá administrar e aplicar bem os recursos. Entre os políticos da AL, o dinheiro “dado” pelo contribuinte, não tem retorno algum.
Percebam que o aplicador (o comprador dos papeis) não recebe um centavo pelo seu dinheiro a não ser um pedaço de papel. Mais nada. Há risco e crença, além de uma confiança e um desejo otimista de que o dinheiro será bem administrado. A ética capitalista, pressupõe essa confiança no outro. Coisa impensada no mundo socialista que abomina o mercado e ver no capitalista um inimigo. Essa mentalidade capitalista moderna, jamais, eu repito, jamais fez morada na América Latina. Basta ver as conseqüências hoje.
laurencebleite@zipmail.com.br

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