17 de fev. de 2008

Muito secreto

Por Augusto Nunes

Em 1979, quando o general João Figueiredo (foto) deixou a chefia do Serviço Nacional de Informações (SNI) para presidir o último governo militar, o país soube que o escolhido fora poeta na mocidade. Os versos publicados informavam que, por respeito à rima, o autor abusava dos verbos no infinitivo. "Quem ouvir clarim tocar/tem que se exaltar!", decretava, por exemplo, a abertura de Chora clarim!.
Em 1999, o general Octávio Medeiros, chefe do SNI durante o governo Figueiredo, falou à imprensa pela primeira (e última) vez. "Me deixa em paz, recebi ordens para não falar", rosnou para o repórter da revista Veja que o abordara no meio da caminhada vespertina por uma rua do Rio. Militares na reserva não recebem ordens, estranhou o jornalista. "Não foi ordem, foi pedido", encerrou Medeiros.
Instalados no comando do SNI, ambos haviam contribuído para induzir o Brasil a acreditar que o ocupante do cargo deveria preencher três pré-requisitos: ser general-de-brigada, usar óculos escuros e não abrir a boca em público. Fora do cargo, os dois revelaram - um com dois versos, outro com duas frases - que havia uma quarta exigência.
Além dos outros pré-requisitos, o chefe do serviço secreto à brasileira deveria alimentar a suspeita de que nem sempre há vida inteligente sob um quepe. Figueiredo pelo que disse e pelo que deixou de fazer, Medeiros pelo que fez e pelo que deixou de dizer, nenhum tinha mais neurônios que estrelas na farda.
O SNI foi enterrado há mais de 20 anos no fundo da vala comum das más lembranças. Mas o serviço secreto não morreu. Seja lá qual for seu nome, todo país tem um, decidiram os civis um minuto depois da chegada ao poder. E alguém precisa estar no comando dessa relevância, constaram no segundo seguinte.
Assim começou a gestação do que hoje tem o nome de Agência Nacional de Inteligência. (Podem chamá-la de Abin. Ela atende). Assim começou a carreira de Jorge Armando Félix como integrante do elenco permanente do Teatrão do Planalto. Finge que não, mas é ele o comandante dos arapongas federais.
Disfarçado de chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, passou alguns anos no semi-anonimato dos figurantes. Transformou-se num dos destaques do grupo graças ao bom desempenho no espetáculo dos cartões corporativos. E o país soube que, dos quatro pré-requisitos vigentes na fase crepuscular do período autoritário, apenas dois não perderam o prazo de validade.
O chefe da turma que garante nas sombras a segurança da pátria é um general-de-brigada. Mas o governo dispensa tanto o uso de óculos de aviador quanto o voto de silêncio. Félix fala até demais, vive dizendo o que pensa. Acha, por exemplo, que a divulgação da gastança da Primeira Família ameaça a segurança nacional. Deve ficar em segredo até a conta da lavanderia. Se descobrirem que o presidente prefere cuecas samba-canção, alguma coisa farão o que o general qualifica de "grupos inimigos".
Ele também prefere guardar sigilo sobre o desperdício de dinheiro promovido por arapongas armados de cartões corporativos - que preenchem a papelada só com números de seis dígitos. Quantos neurônios tem na cabeça um homem que pensa assim? Outro segredo.

2 comentários:

Abreu disse...

Olá Giulio,

Obrigado por ter conseguido passar um dia inteiro sem postar colando fotgrafias do batráquio apedeuta.

Nessas condições, consigo ler seus posts, sem evitá-los!

Sds.,

Anônimo disse...

O Fig,viabilizou a transição, mas saiu pela porta dos fundos.A palavra "fundos" me causa calafrio e no petismo causa frenesi,mas,o Fig saiu por traz para não passar a faixa ao Sarney.Deve ser esquecido como pediu.E não se chuta cachorro morto.
Mas, NÃO ERA LADRÃO.