21 de abr. de 2008

Nelson Jobim, próximo ao general Augusto Heleno

Por Josias de Souza

Ao criticar a política indigenista do governo, o general Augusto Heleno, comandante Militar da Amazônia, provocou a ira dos defensores dos direitos dos povos indígenas. A pedido de Lula, o ministro Nelson Jobim (Defesa) convocou o general a Brasília. Reuniu-se com ele, a portas fechadas, na noite de sexta-feira (18). Depois, deu o caso por “encerrado”.
Não se sabe o que conversaram Jobim e Heleno. Sabe-se, porém, que o ministro tem, sobre a matéria, opiniões que mais o aproximam do que afastam do general. Em 1996, quando era ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso, Jobim foi, ele próprio, alvo de ataques acerbos dos aliados da causa indígena.
Assinou, em 8 de janeiro daquele ano, o decreto 1.1775. O documento fixa regras para os processos de demarcação das terras indígenas. Traz no artigo 9º a previsão de manifestações das partes contrariadas, os chamados “não-índios.” Há 12 dias, Jobim recordou o episódio, ao falar a deputados federais, numa reunião da Comissão de Relações Exteriores da Câmara.
“Quando ministro da Justiça, alterei substancialmente o fórum de demarcação de terra indígena, assegurando o contraditório”, disse ele. “Apanhei por causa disso. Todo mundo me acusou, dizendo que eu era isso, que eu era aquilo.”
Não dei bola, até porque não dou bola para acusação. [...] Tenho couraça de crocodilo. [...] Não dou a mínima bola. Hoje não se fala mais.”
No encontro com os deputados, que ocorreu antes da palestra em que o general Heleno tachou de "lamentável, para não dizer caótica" a estratégia ingenista oficial, Jobim expôs raciocínios que permeiam o pensamento médio das Forças Armadas, expresso nos rompantes do comandante Militar da Amazônia. Deu-se em resposta a observações do deputado Ruy Pauletti (PSDB-RS).
O parlamentar mencionou a Amazônia. Sem citar a reserva Raposa Serra do Sol, falou especificamente de Roraima, Estado em que se encontram assentadas as terras que suscitam tanta polêmica. “Vamos perceber que as riquezas minerais, que lá são abundantes, vão estar, quase todas elas, dentro das áreas indígenas.” Pauletti falou também do interesse internacional que a região desperta.
Na resposta, Jobim disse coisas assim:
1. Demarcações: “Não podemos radicalizar, porque a radicalização se torna da seguinte forma: demarca a terra indígena. Segmentos que apóiam o setor indígena começam a dizer que aquilo é propriedade deles. Não é. Não é.”
2. Propriedade: “Uma coisa é a propriedade da terra, que é da União; outra coisa é o usufruto vitalício dessa terra à comunidade indígena. Então, terra indígena é terra de propriedade da União concernente ao uso indígena.
3. Soberania: “Os europeus destruíram suas florestas e seus índios, agora querem discutir a nossa. [...] Não tivemos aqui nenhum Custer, não tivemos Little Bighorn. [...] Nós não podemos criar na perspectiva de tentar verificar que demarcação de terra indígena é entrega de soberania. Não é. Temos de tratar desse assunto.”
4. Riquezas: “Temos que enfrentar, discutir o problema de mineração em terra indígena, como vamos tratar desse assunto. É importante? É. Faz parte de um processo eventual de um grande plano de auto-sustentabilidade da Amazônia? Pode fazer.”
5. Zonas de fronteira: “Alguns confundem terra indígena com terra de fronteira, com faixa de fronteira. ‘Ah! Não pode ter terra indígena em faixa de fronteira’. Se não pode ter terra indígena em faixa de fronteira, não pode ter propriedade particular em terra de fronteira. Faixa de fronteira não significa propriedade. Significa possibilidade de uso diferenciado, disciplinado, intervencionista para preservar o espaço nacional. É isso.”
Fica claro, pelo timbre de suas declarações, que o ministro não cerra fileiras entre os que advogam, de modo incondicional, os interesses dos índios. Longe disso. E não são posições de agora. Jobim as traz entranhadas em sua biografia. Depois do decreto que assinara sob FHC, ele foi alçado a uma cadeira do STF. Ali, voltaria a tratar de demarcações indígenas. E, de novo, açularia os ânimos dos militantes da causa indígena.
Por exemplo: em julho de 2005, época em que presidia o Supremo, Jobim concedeu liminar sustando os efeitos de um decreto que Lula assinara quatro meses antes. Tratava da demarcação de terras da tribo dos Guarani Kaiowá, no município de Antônio João (MS). O ministro atendeu a mandado de segurança impetrado por 16 pecuaristas que atuavam dentro da área atribuída aos índios. Seguiram-se novos protestos e mais protestos, tingidos de comoção.
Como se vê, Jobim pode até ter atendido ao pedido de Lula. É possível que tenha admoestado o general Augusto Heleno. Mas há de ter-se pautado pelo dever de ofício. No íntimo, é possível que o ministro faça reparos à forma, mas não discorda tanto assim do conteúdo da fala do general.

Um comentário:

Anônimo disse...

Fiquei contente ao saber que Jobim demonstra pelo menos um pouco de inteligência. Achava que o ridículo era caso perdido. Ele, de farda com a "MÃE"... lembram? Naquele dia, ele realmente se excedeu.