21 de jun. de 2007

Porque me envergonho do Brasil- i

Por Peter Wilm Rosenfeld

Até há não muito tempo, orgulhava-me de ser brasileiro e alardeava esse meu sentimento sempre que podia, quer no Brasil como no exterior. Em abril de 2004 e em maio de 2005, já mencionei as razões pelas quais não mais me ufanava pelo Brasil.
Era uma terra abençoada, não só com riquezas naturais quase ilimitadas, com um clima dos melhores (apesar das eventuais secas no Nordeste), com um solo que “em se plantando, dá” e com um povo que, em sua maioria simples e desprovido de riquezas, era extremamente bom e generoso.
Aqui conviviam em harmonia pessoas de origens geográficas, colorações e nacionalidades de toda a natureza. Não havia discriminação, nem de parte da grande massa da população como, tampouco, em virtude de leis ou de costumes. Um povo alegre, que curtia seu esporte favorito, futebol e seu divertimento por excelência, o carnaval.
Apesar de seu imenso território, o brasileiro conseguiu manter o país uno. Claro, certos sotaques regionais podem dificultar um pouco a compreensão do que está sendo falado, mas é sempre a língua portuguesa.
O triste é que essa situação vem se deteriorando, ou modificando para pior, há já algum tempo.
Corrupção sempre houve. Como não havia jornalismo investigativo como há hoje; como os meios de comunicação eram bastante precários, não ficávamos sabendo de muita coisa. De ressaltar, porém, que havia de parte dos políticos um nível intelectual e um sentimento de decência infinitamente superiores aos que existem hoje. O ensino era muito mais sério, os professores eram, em geral, altamente qualificados e os alunos sinceramente dedicados ao aprendizado.
Claro, as assim chamadas elites dominavam o cenário em todas as atividades. O “povão” participava pouco, até porque não reunia condições intelectuais para entender o que se passava. Isso, porém, não impediu que muita gente humilde, mas séria, tenha se destacado naquele então.
E quando começou a degringolada, a deterioração, dessa situação ? E por que isso aconteceu?
No que concerne ao “quando”, diria que foi com a ditadura Vargas; sabido e comprovado que, via de regra, todas as ditaduras acabam deteriorando a moral das pessoas, pela eliminação dos que se destacam, pela imposição de regras e padrões que contrariam profundamente todo e qualquer princípio são. O “mar de lama” que sujou o Brasil existiu de fato, não foi invenção dos meios de comunicação ou dos políticos. Foi uma conseqüência natural dos 15 anos da ditadura.
O processo de agravamento de muitas das distorções que existem hoje se acentuou com a construção de Brasília e com a mudança da capital federal para o planalto. Na construção de Brasília, nenhum parafuso, nenhum quilo de areia ou de outro material, nenhum frete, foram vendidos e entregues pelos preços normais. Tudo, absolutamente tudo, foi superfaturado. Não bastasse isso, foram criadas mordomias para todos os funcionários, desde o Presidente da República até os mais humildes servidores, para que morassem em Brasília. Passagens em profusão, habitação subsidiada, adicionais de vencimentos, não houve limite para essas vantagens, com o defeito de que perduram até hoje. Deputados Federais eleitos por Brasília têm direito a auxílio moradia. Quando Vice Presidente da República, Café Filho morava em um apartamento de sua propriedade em Copacabana, se não me falha a memória na Rua Siqueira Campos. Hoje o Vice Presidente dispõe do Palácio do Jaburu. O Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira causou um mal irremediável a este País!
O efêmero governo Jânio Quadros se propunha a varrer com vassoura todas as sujeiras então existentes, mas durou pouco. Quis dar um golpe, mas acabou renunciando. A época Jango Goulart, tremendamente conturbada, acabou sendo dominada pelo cunhado que queria sucede-lo (e, dizia, cunhado não era parente !) e pelos fortes movimentos esquerdistas. Por isso foi derrubado. Claro que também houve corrupção.
Pulando os anos da “Redentora”, em que também havia corrupção mas com censura, chegamos ao governo Sarney (que nem deveria ter sido, pois o Presidente eleito não chegou a assumir !), de muito triste memória, que tentou caçar bois no pasto, que nos presenteou com a mais alta inflação jamais tida antes ou depois (84% em março de 1991), e com deslavada corrupção.
Saltemos diretamente aos governos FHC e Lula. No primeiro desses, praticou-se de maneira absurda a compra de votos de congressistas para aprovação da re-eleição. Ao mesmo tempo, a privatização de algumas empresas foi eivada de ilegalidades, inclusive no que se refere aos dinheiros. O primeiro mandatário cometeu alguns deslizes, como o de chamar os aposentados de vadios. Em linhas gerais, porém, não houve barbaridades maiores.
Já no governo Lula, apesar de ele estar se saindo razoavelmente bem na economia (graças, principalmente, ao fato de ter mantido no governo o Presidente do Banco Central, contra o desejo do PT), tem sido um desastre em muitos aspetos, fazendo com que me esteja envergonhando de ser brasileiro. Suas gafes têm sido imperdoáveis. Exemplos recentíssimos: “Esse negócio que as pessoas falam que têm que aprender a falar inglês, aprender francês, aprender espanhol, é muito bonito, mas é fantástico como as pessoas mais humildes deste país conversam em qualquer língua por mímica”. “Sair de casa é um estado de espírito. Você tem que levantar, tudo tem que estar com energia positiva, tem que estar com humor, a mulher tem que acordar: “”Amorzinho, vamos amorzinho””. Porque, se ela começar xingando, o marido já não vai. Já bota o cuecão, fica deitado ali mesmo e não sai”. Que ainda avisa que se algo não for feito vai tudo para a “cucuia”.
Sem falar nas repetidas menções ao fato de que “nunca antes nesse País”, ou “consertar algo que foi destruído durante 400 anos em apenas quatro anos”, e tantas outras que temos ouvido nos últimos 50 meses de governo Lula.
Tais gafes têm sido freqüentes ao longo dos 4 anos e meio de mandato. São ridículas e são deprimentes. Além disso, prefere distribuir esmolas (como o salário família) ao invés de incentivar o povo a estudar, a se aprimorar.
Ademais, com a instituição do sistema de quotas raciais, está fazendo com que se crie no Brasil o sentido da discriminação racial que, como apontei antes, não existia no Brasil. E esse sentido logo, logo, se estenderá às religiões, ao nacionalismo; infiltrar-se-á como erva daninha na cultura do povo. É um dos maiores crimes que poderia ser cometido contra os brasileiros, pelo qual várias gerações futuras pagarão.
Para adicionar sobre as razões de minha vergonha atual, o Governo não sabe se desfazer de auxiliares que muito prejudicam o País. O mais recente exemplo é o da Ministra do Turismo, que está relaxada e gozando de seu cargo. Como o foi, à época, o então Ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, que agrediu de forma vil os aposentados idosos, nada lhe tendo acontecido. É o que aconteceu com a nomeação de um pseudo-brasileiro para o Ministério já carinhosamente cognominado de “Alopra” (Ações de Longo Prazo). Sem falar no patético Ministro da Defesa.
A moral, a decência, o sentimento de dever, tudo praticamente deixou de existir em nossa política. A corrupção, a mentira, a desfaçatez, a falta de vergonha estão imperando plenamente. É quase que um “salve-se quem puder”, levando os bons a se afastarem da política a fim de não serem taxados de desonestos.
E, por fim, a absoluta e total imoralidade, indecência, e quantos “iiis” mais foram possíveis, de nossos três poderes, mais notadamente o Congresso. Nunca vivemos um momento assim, com a mais absoluta certeza. Há os limpos e corretos, claro. Mas estão ficando em significativa minoria (sobre isso, na próxima semana explicarei melhor).
Real e lamentavelmente, levaremos várias gerações para nos recuperarmos de tudo isso que está acontecendo (supondo-se, o que não é certo, que o Brasil continue a ser uma República em que continue vigendo um regime democrático).

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