26 de ago. de 2007

Kikito

Por Peter Wilm Rosenfeld

-Em primeiro lugar, minha apresentação: sou filho de Erich (Érico, para os gramadenses) Rosenfeld, casado em segundas núpcias (1938) com Elisabeth Rosenfeld. A primeira senhora Rosenfeld, Eva Anneliese (Evchen) faleceu em 1937. Erich Rosenfeld tinha dois filhos, Evelyn (1929) e Peter (1931), ambos nascidos em S. Paulo. Erich e Eva haviam imigrado para o Brasil em 1927, estabelecendo-se em São Paulo (SP).
-A família (já com Elisabeth ) veio para o RS em 1939, aqui chegando no exato dia em que começou a II guerra mundial, estabelecendo-se em P. Alegre. Erich veio gerenciar a filial de u’a multinacional americana, que fabricava caixas registradoras e máquinas de contabilidade (sendo mais conhecida pelo primeiro dos dois produtos). Elisabeth, além de ser uma artista muito talentosa era, igualmente, excelente ginete. Em curto espaço de tempo entrosou-se com o esporte de equitação gaúcho, do qual se tornou grande divulgadora.
-Com a intensificação do conflito mundial, a empresa de cuja filial Erich era gerente aqui em P. Alegre foi convocada a participar do esforço de guerra e sua capacidade produtiva foi quase que totalmente desviada para material bélico, conseqüentemente paralisando as importações. Os negócios no RS se limitavam à manutenção das máquinas existentes.
-A fim de manterem uma atividade que lhes interessasse, e tendo em conta o amor que Elisabeth dispensava a cavalos, o casal resolveu comprar uma propriedade (cerca de 90 hectares) em Caracol, distrito de Canela, iniciando uma pequena criação de cavalos de raça. Em janeiro de 1945 resolveram organizar uma competição hípica em sua propriedade serrana, para a qual foram convidados – e compareceram, os principais cavaleiros do RS, à frente o então Governador (Interventor) do Estado, Gal. Ernesto Dornelles e constando, ainda, do então Capitão Plínio Figueiredo, campeão de saltos no ano anterior, Cel. e Sra. Justino Alves Bastos, ele então Comandante do CPOR e muitos outros. Uma composição especial da então Viação Férrea do Rio Grande do Sul transportou cavaleiros e montarias de Porto Alegre a Canela.
-Desnecessário dizer que o evento entusiasmou os moradores de Caracol e de suas vizinhanças, que nada conheciam daquele esporte estranho. Foram três dias de grande movimentação na bela região serrana
-Com o passar do tempo o casal decidiu procurar uma propriedade em Gramado, pois Caracol havia evoluído muito pouco e os Rosenfeld desejavam morar em uma cidade onde houvesse uma infra-estrutura mais de acordo com sua idade e que lhes permitisse estabelecer um artesanato.
-O local escolhido foi o terreno onde hoje se localiza o supermercado Unidão, no final da Av. Borges de Medeiros, propriedade que foi permutada pela de Caracol. Além de construírem sua residência, Elisabeth resolveu dar vazão a seus dotes de artista plástica, criando o Artesanato Gramadense, que iniciou com dois teares simples, manuais fazendo tapeçarias, tapetes e, em madeira, esculturas e talhas. Como é sabido por todos os que não são muito jovens, o Artesanato Gramadense tornou-se uma referência nacional, visitado por turistas nacionais e estrangeiros. Os produtos do artesanato podem ser encontrados em muitos estados brasileiros e em vários países.
-Lá nasceu o Kikito, hoje considerado o mais importante prêmio do mais importante festival de cinema nacional, o de Gramado-RS, cidade da qual se tornou símbolo.
-Uma réplica em cimento, com cerca de 1 m. de altura, foi colocada no centro do jardim circundado pelas construções em que funcionava o artesanato. Nesse jardim, Elisabeth e Erich, todas as tardes, reuniam seus colaboradores no Artesanato para um café/chá da tarde com bolos, cucas e outros doces. Uma confraternização que não existia em qualquer outra indústria ou atividade de Gramado. O Kikito, Rei do Sol e do Bom Humor, fazia com que todos se sentissem “GENTE”, e não simples empregados/funcionários/subalternos. Esse Kikito de cimento hoje está no jardim da casa de uma das netas).
-O casal resolveu atender aos organizadores do Festival de Cinema de Gramado, que estava começando a ser realizado, autorizando que réplicas do Kikito fossem usadas como prêmio maior. Enquanto viveram (Elisabeth faleceu primeiro, em 1980 e Erich anos depois, em 1985), eles próprios encomendavam e patrocinavam a confecção das estatuetas, em madeira de lei, com 33 cm de tamanho e dezesseis pontas circundando a face. Dessa maneira, mantinham seu vínculo direto com o Kikito. Jamais doaram a quem quer que fosse os direitos autorais sobre a estatueta.
-Com seu falecimento, a Prefeitura Municipal de Gramado, infelizmente, praticou vários atos ilegais, dois deles constituindo verdadeiras heresias; outro, pura apropriação indébita !
-As heresias vem sendo agravadas cada vez mais: primeiro, a estatueta passou a ser confeccionada em metal, dando-se-lhe um banho dourado, ao invés de, como no original, de madeira, como se isso aumentasse seu valor (na edição deste ano, inventaram até uma estatueta de cristal!!!); a outra heresia: fizeram a estatueta com 12 pontas ao redor da face, ao invés de com as originais 16 pontas. A apropriação indébita através da continuação de seu uso sem qualquer respeito aos direitos autorais. Como esses direitos jamais foram transmitidos à Prefeitura Municipal, pertencem aos herdeiros dos Rosenfeld, em primeira linha seus dois filhos, Evelyn e Peter e, em seguida, aos netos. Estão registrados em nome de uma das netas.
-Trata-se de mais uma ilegalidade cometida pelas autoridades, que deveriam ser as primeiras a não infringi-las mas são, sempre, as maiores transgressoras.
-Mas o que esperar de governantes com tão rasteiros princípios morais?

Nenhum comentário: