Adriana Vandoni
Ottomar era meu amigo, fomos colegas na Fundação Getúlio Vargas no curso de Administração Pública.
No começo era meio calado, mais observava que falava. Mas, o coitado, desde o primeiro dia em que apareceu na aula, resolveu sentar-se no meio do nosso grupo (éramos três inseparáveis: Eu, Carla e Bete). Não tardou para que Ottomar se soltasse e interagisse totalmente ao nosso grupo.
Fazíamos todos os trabalhos juntos, às vezes com intensas discussões, como foi um trabalho sobre os poderes do Ministério Público. Ele resolveu discordar do que eu estava falando durante a apresentação, imaginem a cena: nós em pé, os professores e o restante da turma assistindo e Ottomar discutindo, sempre falando calmamente. Devagar e sempre. Ele achava que os poderes de investigação deveriam ser limitados e eu defendia que os poderes do MP deveriam ser expandidos. A situação começou a ficar constrangedora, a turma ria sem parar, os professores riam pelo canto da boca, ou seja, estávamos fazendo um showzinho. Até que eu, já morta de vergonha, disse: “Ottomar você está certo, acontece que estamos em lados opostos do balcão. Você é um político, logo, passível de investigação. Por isso acha que os poderes devem ser restritos.” E como sempre em nossas discussões, tudo acabava em gargalhada.
A Bete pegava mais no pé dele, principalmente nas vezes que ele dormia na sala de aula, fato que não era raro. Dizíamos que durante o tempo em que era parlamentar, ele tinha desenvolvido um mecanismo de "dormir em si"....risos....ele encolhia o seu já encolhido pescoço e simplesmente dormia de roncar.
Aprendi muito com Ottomar e com sua experiência de vida. Aprendi com ele a realidade da política. Se no curso eu aprendia a teoria e o fazer certo, com Ottomar eu aprendia o viável dentro do cenário real da política brasileira feita por esses políticos brasileiros. No curso, o lado romântico da administração pública, com ele a rudeza da realidade. Como na vez que num bate-papo, eu disse em quem ia votar para senador em 2002 e ele perguntou: ele sabe que você vai votar nele?, respondi: sei lá, Ottomar, acho que não. E ele me saiu com esta: então pra que votar? Primeiro faça-o saber que seu voto será dele, do contrário, nem vote.
Certo dia, durante a pré-campanha de Lula em 2001, Ottomar entrou na sala e nos pegou num caloroso debate sobre os cenários para o Brasil com cada um dos candidatos a presidente. Eu achava que Lula não conseguiria governar, pois ele não teria a maioria no Congresso. Em nossa sala os debates costumavam ser intensos, era uma turma eclética e tinha alguns petistas ferrenhos, alguns viraram ilustres, como por exemplo, Manuel Severino que virou presidente da Casa da Moeda até cair no esquema de Marcos Valério. Ottomar vendo todo aquele debate, chegou bem perto de mim e disse baixinho, passando a mão no meu braço, como sempre falava conosco: “filhinha, em um regime presidencial como o nosso, a maioria é sempre do presidente, não importa quem seja ele, muito menos por qual partido se elegeu”.
Durante a sua pré-campanha para o governo, em 2001, tínhamos um trabalho para entregar, nesse trabalho nosso grupo era formado por nós dois apenas. Antes de sairmos do Rio, ele rumo a Boa Vista e eu para Cuiabá, combinamos a parte que ele me enviaria por e-mail até tal dia. Passei duas semanas recebendo e-mails diários de Ottomar com a frase: “Tô na área”. E nada do material. Era apenas “Tô, na área” e nada. Depois de uns 15 e-mails desse, eu respondi: “Pois saia da área, engraçadinho, que o trabalho já tá pronto, ok?”
O “tô na área” virou gozação na nossa turma e quando ele entrava na sala já dizia: “meninas, tô na área”.
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