27 de fev. de 2008

L'Esprit des lois

Leia abaixo o artigo L'Esprit des lois que comenta a atual fase de indecisão vocacional do juiz federal Julier Sebastião (foto), os convites que tem recebido para se candidatar em 2010 e fatos tão sutis quanto comprometedores que vão além dos tais convites e da crise vocacional. (clique em “Leia mais”)

Atualização:
Agora me deu um “estalo”, que não tive na hora que escrevia o artigo. Um Juiz Federal diz que está conversando sobre política com um conselheiro do Tribunal de Contas, e não fica rubro de vergonha?
Será que o juiz sabe que conselheiros dos TC não devem fazer política, mas fiscalizar as administrações dos políticos? Exmo conselheiro Novelli, vossa excelência faz política “enquanto” conselheiro? (depois de ler o texto, você entenderá esta atualização)


L'Esprit des lois
Por Adriana Vandoni

O cenário político para 2010 pode tomar rumos inesperados e surpreendentes, mas não tão absurdos, já que a política é dinâmica e não há situações absurdas que não possam nela ocorrer. Digo isso pelo que declarou o juiz federal Julier Sebastião da Silva ao admitir que pode vir a ser candidato nas eleições de 2010, e que tem recebido diversos convites. Segundo ele, já conversou com Silval Barbosa (vice-governador/PMDB), com o conselheiro Jose Carlos Novelli e também com Blairo Maggi (governador/PR).
Ligado ao PT por laços de amizade e ideologia, foi filiado ao PT, declarou que um dos convites que recebeu foi do atual prefeito de Cuiabá Wilson Santos, presidente regional do PSDB. O convite aconteceu no fim de semana em Chapada dos Guimarães, na chácara do prefeito, onde acabou sendo convidando para ser candidato ao senado, numa dobradinha: Wilson ao governo e Julier para o Senado.
A notícia levanta alguns pontos que devem ser analisados além do tal convite ou da possibilidade de aceite. A prefeitura de Cuiabá está passando por aperreios com a Justiça Federal por conta de supostas irregularidades na licitação do PAC. Julier é o Juiz Federal Presidente da 1ª Turma Recursal. A pergunta é: era o cidadão Julier quem estava em um descontraído fim de semana na chácara de um amigo, ou um juiz federal que estava sendo agradado por um prefeito com pendências administrativas na Justiça Federal? Não consta que ambos tenham amizade de longa data, pelo contrário, o que consta é uma ligação de forte amizade entre Julier e Alexandre Cesar, atual deputado estadual do PT e candidato derrotado pelo próprio Wilson nas eleições municipais de 2004.
Consta também que às vésperas da eleição de 2004 (no dia 15 de setembro), o Juiz Julier determinou busca e apreensão no diretório Estadual do PSDB a procura de qualquer material capaz de comprovar ligações do partido com a factoring do bicheiro Arcanjo. O ato foi considerado como sendo eleitoreiro para beneficiar seu amigo Alexandre César contra o então adversário Wilson Santos.
Em 2006, na CPI dos Bingos, o juiz afirmou que “parte do dinheiro utilizado [na campanha do PSDB em 2002] veio das empresas de factoring de propriedade de João Arcanjo Ribeiro, conhecido como 'Comendador', que liderava o crime organizado no estado”.
Os fatos devem ser investigados sim. Se houve ou há uso de dinheiro oriundo do crime em campanhas eleitorais, seja de qual partido for, isso deve ser investigado até o fim, doa a quem doer. E esses delitos devem ser punidos de forma exemplar.
Mas quem poderá julgar e determinar uma sentença? Alguns leitores vivem me cobrando imparcialidade e sempre tento explicar que colunas opinativas são incompatíveis com a imparcialidade, e explico: imparcialidade deve ser cobrada de juízes, não de articulistas. Pois bem, no caso do juiz Julier é possível esperar imparcialidade?
Como poderemos julgar seus atos como Juiz? E quanto aos propósitos dos seus julgamentos? O que o orienta? Sua formação e preparo para ser um juiz, sua militância petista, a consciência do Julier que passa fim de semana na chácara do presidente regional do PSDB, ou suas futuras pretensões políticas?
Acredito e estimulo que pessoas de bem, íntegras, corretas e justas entrem na política. Entendo que só assim será possível vislumbrar uma mudança no estágio escandaloso da política brasileira. Mas é preciso ter bom senso nesta fase de crise vocacional. O juiz Julier tem todo direito do mundo de passear na chácara de um amigo prefeito. Tem qualidades que o permitem sonhar com sua imagem no Senado, onde certamente fará um bom trabalho. E possui competência legal para julgar crimes. Mas não pode confundir sonhos e funções sob pena de comprometer a legitimidade de cada um dos atos que julga, ou inflige.
O fato ocorrido (convite do PSDB, circunstância do convite e possibilidade de aceite) é tão inusitado que só existem duas alternativas dignas para solucioná-lo: ou o PSDB nacional enquadra o presidente regional do partido, ou a Justiça considera que um dos seus quadros está sob suspeição.
Talvez uma releitura de Montesquieu lhe faça bem.

2 comentários:

Anônimo disse...

Boa tarde, Adriana.

Para um cidadão com a minha idade - 64 anos - ainda chocam certas informações, muito embora eu as entenda intelectualmente. Não sou saudosista, felizmente. Nem tampouco sou daqueles que se dizem ser um homem de sua época. Sou conservador no que diz respeito às diferenças entre virtude e vício. "Sede perfeito como o vosso Pai.." é, para mim, a tradução de uma lei que impõe à natureza a busca permanente de aperfeiçoamento e, como tal, exige que qualquer homem busque atualizar o que há em si potencialmente. Difícil? Muito, mas não impossível. Observamos esse fenômeno na evolução das espécies na busca de adaptação e sobrevivência, na tecnologia que é resultado da procura em uma condição de conhecimento que mais se aproxime do imperativo de dois princípios; o do mínimo esforço e do máximo rendimento. A preservação da vida e da liberdade está inscrita na própria natureza de todos os seres, ainda que existam níveis de liberdade. No caso do reino mineral há um mínimo de autonomia, mas ela já começa a se manifestar no reino vegetal e assim progressivamene até alcançar o reino hominal. Todo esse prefácio para justificar a necessidade do homem lutar contra o vício que seduz, que encanta, que atrai com força tremenda para si as nossas emoções e intelecto. A natureza beneficia aquele que, através do próprio esforço, realiza seus potenciais. Podemos almejar qualquer atividade humana sem que isso signifique uma mera pretensão.
Mas, observo que no Brasil a coisa está ficando ruça. Poderia até se admitir que ela está ficando russa com tendências à 1.917. A galera se instalando no poder e o vício se espraiando como se fosse virtude. Estamos perdendo a confiança em nossas autoridades graças aos esforços desmedidos que elas fazem para que isso se torne real. Juizes descaradamente julgando ideologicamente, ou de acordo, como já foi noticiado, com o volume da propina que cerca a pendenga jurídica. Que um cidadão tenha aspirações de natureza política, nada mais justo perante a lei. Mas que se afaste muitas léguas das atividades que comprometem esse propósito.
É nesse aspecto que o Brasil caminha para um desencontro consigo mesmo. Muitos dizem que necessário. Eu prefiro imaginar que a inteligência humana pode e deve guiá-lo para dias melhores. Mas que as notícias assustam, isso é fato.
Tenho admiração pelo trabalho da senhora e de todos aqueles que movidos pela inquietação moral ainda se escandalizam diante da nudez ética. Talvez seja essa a coisa boa que o PT veio nos brindar.
Abraço

Adriana disse...

Meu caro Léo, obrigada pelas suas palavras. Vc tem toda razão, o brasileiro está perdendo a confiança nas autoridades e isso é muito grave.
Mais uma vez, obrigada.
grande abraço
Adriana