13 de jun. de 2007

Faz-de-conta

Por Peter Wilm Rosenfeld

Talvez muitos não se tenham dado conta ainda, mas estamos vivendo em um País do FAZ-DE-CONTA há bastante tempo. Vamos aos exemplos:
- Faz-de-conta que os governos, inclusive o Governo Lula no primeiro e, agora, no segundo mandato, tenham verdadeiramente tratado dos interesses da população, proporcionando:
- Educação, com quantidade, qualidade e remuneração de professores, mantendo adequada qualidade nos estabelecimentos de ensino público;
- Sistema público de saúde, com profissionais competentes em quantidade suficiente de postos de saúde, proporcionando o fornecimento de remédios de uso continuado a preços razoáveis;
- Previdência social digna e justa, com respeito pleno dos aposentados e pensionistas, desde o momento em que os cidadãos requeiram passar para a inatividade;
- Segurança, a fim de que a população não tenha que viver atrás das grades enquanto os criminosos estão às soltas, bem como os motoristas não sejam permanente assaltados em sinais de trânsito, em caminhões de carga, etc.
- Sistemas de transporte público urbano e interurbano de qualidade e quantidade suficientes para evitar que a população sofra desgastes desnecessários e não-justificados em seus deslocamentos, principalmente nos necessários entre a casa e o local de trabalho.
- Vamos ainda fazer de conta que:
- O transporte de longa distância, rodoviário e ferroviário, tenha sido mantido e aprimorado proporcionando deslocamentos rápidos e econômicos no transporte de pessoas e de mercadorias, efetivamente unindo o País;
- O sistema portuário tenha sido preparado para operar de maneira eficiente, a custos compatíveis com os vigentes em países modernos.
- Façamos ainda de conta que:
- Tenha havido um legítimo esforço para melhorar nossos sistemas tributário e legal, de modo que pagássemos impostos compatíveis com o nível dos serviços proporcionados pelo poder público, com leis justas e atualizadas para o estágio atual da civilização;
- Um trabalho sério tenha ocorrido visando a termos um poder legislativo (nos três níveis de governo) atuante e diligente, realmente preocupado com a melhoria do bem estar dos contribuintes e com a manutenção de condições verdadeiramente republicanas (palavra muito em voga, principalmente com o advento do atual governo) na condução dos negócios de interesse do País;
- Uma verdadeira conscientização tenha ocorrido para a eliminação da corrupção e, nos casos de a mesma vier a ocorrer, os responsáveis sejam realmente punidos;
- Que tivesse sido envidado um esforço real para redução da monumental burocracia que infelicita o País de forma crescente.
A lista poderia ser aumentada de forma significativa se todos os problemas enfrentados pelo País nessas últimas décadas, não sanados, fossem elencados. E se o tivessem sido, em que belo País estaríamos vivendo !
Mas não, em nosso Brasil do faz-de-conta, nada disso aconteceu. Ao contrário, a situação vem se deteriorando a cada dia que passa, para desespero de todos (exceto dos políticos ocupando quaisquer cargos, eletivos ou não, e de uma significativa parcela dos integrantes do Poder Judiciário). Não obstante, todos afirmam e juram que estão seriamente tentando reverter a situação.
Para não retroceder exageradamente no tempo, e para evitar que se diga que a “Redentora” de 1964 não conta, vamos aos governos pós-redemocratização, começando com o do Sr. José Sarney (que, diga-se de passagem, foi empossado indevidamente. Era Vice-Presidente de um Presidente que não o foi, por ter falecido antes).
O Gov. Sarney nos proporcionou o maior índice inflacionário da história do Brasil, que chegou a 84% mensais. Foi quando assistimos à triste caçada aos bois no pasto, levada a efeito pelo hoje Senador Romeu Tuma, sob a suposição de que os fazendeiros haviam ocultado seus rebanhos... Que evento patético aquele. Não preciso dizer que atualmente o Sr. Sarney é uma das vestais da República, a demonstrar quão curta é a memória do povo. Seu ministério foi composto, em sua maioria, por políticos absolutamente incompetentes(com alguns bastante apetentes !).
O Governo Collor teve alguns lances extremamente corretos (basta lembrar seu ousado e bem sucedido programa de privatização; o que muitos não sabem é que, em esforço de simplificação de procedimentos, revogou cerca de 113.000 leis que não mais serviam). Não conseguiu evitar a corrupção, se bem que o Sr. PCFarias, comparado aos agentes atuais, era aprendiz de feiticeiro). Devido a sua soberba, foi cassado e declarado impedido (“impeachment”, como nossos puristas da linguagem gostam de dizer).
O curto Governo Itamar Franco quis nos remeter ao passado, com o relançamento do Volkswagen original...Ao que se saiba, foi honesto (o que é mérito neste País) e aprovou o lançamento do Plano Real.
O Governo FHC foi um desastre em todos os sentidos, exceto pela defesa intransigente do Plano Real e pela retomada das privatizações, se bem que algumas delas bastante duvidosas quanto à lisura do processo.
Finalmente, chegamos ao atual Presidente. O do “nunca antes nesse País”, o que declarou que não poderia corrigir em quatro anos o que o povo destruiu em 400 anos, etc., etc. Realmente, nunca antes nesse País tivemos uma corrupção tão desenfreada, tão descarada, tão impune. De igual forma, nos 400 anos anteriores, o Estado nunca tinha sido tão aparelhado (por incompetentes) como agora.
A “grande realização” do Governo Lula foi a distribuição de dinheiro sem qualquer requisito de contra-partida (e com um fraco dispositivo de controle). O futuro demonstrará que seus malefícios superaram, em muito, seus benefícios. Devo conceder, porém, que a firme determinação de manter a inflação sob controle – com real êxito, já é uma grande realização, principalmente tendo em vista as pressões contrárias.
Mas, para finalizar, FAZ-DE-CONTA que tudo vai às mil maravilhas !!

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