21 de set. de 2007

Polêmica sobre o voto secreto

Por Armando Bergo Neto - Advogado, Fundador e Diretor do MDC – Movimento pelos Deveres/Direitos do Cidadão

A votação secreta, em sessão igualmente secreta realizada em 12/09, a fim de selar os destinos do senador Renan Calheiros, acusado de quebra de decoro parlamentar, através representação ofertada pelo PSOL, trouxe à baila, novamente, questão polêmica acerca da inviabilidade do voto secreto em nossa atual realidade.
De fato, o voto secreto é por demais inconciliável com um regime democrático. É cediço que nesse tipo de regime político devem imperar, sobretudo, a transparência e a publicidade dos atos, jamais uma maneira sigilosa no trato de questões de interesse público, haja vista que o poder emana do povo que elege seus representantes, conferindo-lhes mandato e, os eleitos, como mandatários que são, têm a obrigação legal de prestar contas aos mandantes. É assim que funciona em qualquer democracia séria, onde são respeitados os direitos dos cidadãos. Não pode o mandatário exercer suas funções sem demonstrar aos mandantes seu “modus operandi”. Isto é, por demais, inconcebível, causando repulsa a qualquer pessoa com o mínimo de consciência cidadã.
Talvez, outrora, quando fora promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil, em 5 de outubro de 1988, se justificasse a regra constante do parágrafo 2º do artigo 55, na qual estatuído o voto secreto em questões relativas à quebra de decoro parlamentar (inciso II) e noutras hipóteses que especifica. É que naquela época o País se ressentia ainda de um longo período de ditadura, fazendo com que o Legislador Constituinte constatasse a relevância de referida regra, no afã de se evitar futuras pressões advindas do chefe do Poder Executivo, já que tal prática estava extremamente arraigada no Brasil até então. Portanto, naquela época, poderia até ser tida como uma norma salutar; no entanto, hodiernamente, é causa de indignação e repulsa, gerando descontentamento na grande maioria dos brasileiros.
Ocorre, todavia, que passados quase 19 anos tal norma não mais se justifica. Pelo contrário, no estágio atual de nossa democracia referida norma está na contramão dos desejos da opinião pública, conforme amplamente divulgado pela mídia, ainda mais agora, após o desastroso resultado obtido no julgamento do Presidente do Senado.
A sociedade clama pela mudança, em regime de urgência, desse sistema caduco e defasado. Uma PEC já existe e tramita a passos de tartaruga perante o Congresso Nacional. Sua aprovação extirpará do ordenamento jurídico pátrio o esdrúxulo voto secreto, totalmente incompatível com um Estado Democrático de Direito. É chegado o momento de a sociedade civil organizada exercer seu poder de pressão, a fim de que não caia mais uma vez no esquecimento este Projeto de Emenda Constitucional. Se não se fizer nada agora, neste momento em que a questão vem sendo discutida exaustivamente, com certeza, mais uma vez esta PEC estacionará, já que para muitos não há interesse em retirar um escudo atrás do qual podem fazer barganha política e, ao mesmo tempo, dizer a seu eleitorado que votou de tal maneira. Quem garante que estarão dizendo a verdade? No caso em apreço, que garantia temos de que, quem disse ter votado pela cassação de fato assim o fez? Não é nada improvável que um senador que tenha declarado seu voto publicamente pela condenação e, em verdade, tenha se comprometido com o acusado e votado pela absolvição. Desta forma acabou ficando confortável e de bem com todos os lados envolvidos (eleitores e acusado), nos colocando um nariz de palhaço sem que déssemos conta disso.
Por outro turno, o tema relativo à sessão secreta, ao que tudo indica, já é favas contadas. Segundo se noticia, após os recentes e fatídicos acontecimentos tem-se que os parlamentares irão modificar o Regimento Interno do Senado Federal (o que pode ser feito sem maiores dificuldades) para que, doravante, tudo ocorra às claras, retirando daquela Casa a sensação de que ali impera um clube fechado, por assim dizer ao estilo de organizações criminosas, o que é totalmente incompatível com o que se espera dos que representam o povo, já que são servidores públicos e, como tal, devem agir em conformidade com os princípios da publicidade, legalidade, impessoalidade, moralidade, e eficiência.

3 comentários:

ma gu disse...

Alô, Adriana.

Grato por nos trazer a palavra abalizada do advogado Armando. Palavras de quem sabe o que está falando.
Se bem que parece ser clamar no deserto, onde ele mesmo reconhece tratar-se de um clube fechado.
E onde se reunem fascínoras, o resultado vai ser o de sempre.
Não vão derrubar o voto secreto. Na improvável hipótese de acontecer, me penitenciarei. Será sinal de que ainda existirão pessoas idôneas naquele ambiente compurscado.

Anônimo disse...

Temas distintos. O sufrágio é direito; o voto materializa. Voto secreto é democrático. No Júri, é secular. Nas Seções Eleitorais, é garantia. Cumpre distinguir voto político (liberdade e igualdade de participação), próximo do decoro (não é procedimento disciplinar no sentido estrito) e voto judicial-objetivo (a decisão tem que ser aberta e fundamentada, é da CF). No Júri, a proteção aos leigos motiva o sigilo (universal). No caso decoro, nada impede o voto secreto, é pessoal (o critério de análise do ato moral ou aético é subjetivo-objetivo). Inaceitável, ato de seita tribal (grave abuso jurídico), a sessão secreta. Um atentado à Soberania Nacional. O absurdo é o julgamento secreto avesso aos princípios constitucionais. Não confundir sessão com voto, nos vários procedimentos de lei para julgar fatos. O voto secreto é garantia; não se cura efeito, mas causa. A outorga de mandato pressupõe responsabilidade - não deve ocorrer capitis diminutio; o sigilo fará falta. As massas crucificam, homens sensatos, decidem.

ma gu disse...

Alô, Adriana.

O anônimo (que saco!) dá uma aula. Boa e sólida. Parte do príncipio que existe gente sensata naquele covil.
Alguns mas, acreditar nisso como um todo mostra que ainda existe gente que acredita em Papai Noel.