24 de out. de 2007

Justiça II

Por Peter Wilm Rosenfeld

Em janeiro deste ano, escrevi um artigo comentando os absurdos que vivemos neste País em função de nossas Leis e Códigos em geral, mencionando alguns exemplos inaceitáveis, sempre favorecendo os criminosos, principalmente os de alto poder aquisitivo.
Hoje, sinto necessidade de abordar outro problema, igualmente relacionado com nossa Justiça.
Refiro-me ao fato de que a polícia faz seu trabalho, prendendo criminosos de toda a gama de atividades; às vezes no mesmo dia, outras vezes poucos dias depois, esses mesmos criminosos são soltos e voltam a cometer os mesmos crimes.
Isso revolta, como não poderia deixar de ser, os policiais que fizeram a captura.
Vale lembrar que exatamente por isso, há já muitos anos, surgiu o esquadrão da morte no Rio de Janeiro. Já que certos criminosos obtinham sua soltura através de “advogados de porta de cadeia”, reincidindo em sua atividade, os policiais cariocas cansaram da rotina do “prende e solta”, passando a matar o criminoso na hora da prisão. Pronto, aquele não mais incomodaria.
Nos primeiros tempos dessa maneira de proceder, a população apoiou essa forma de agir.
Com o tempo, os policiais gostaram da atividade de “matadores” e o sistema começou sua degringolada, passando do ato de matar criminosos ao de matar qualquer um de quem não gostassem ou por encomenda de todo o tipo de gente, mas principalmente com os chamados “bicheiros”, que eram os donos de pontos de venda do “jogo do bicho”.
Com isso, os esquadrões da morte foram perdendo o apoio popular e o procedimento acabou cessando.
Será que desejamos o retorno dos esquadrões ? Com certeza, não. Mas também não podemos conviver ad eternum com o sistema atual.
Sabemos que os juízes têm que ter a independência para decidir de acordo com sua convicção e com as provas que lhes são apresentadas. Mas não se consegue entender que em poucos dias, se não no mesmo dia, um outro juiz possa ser convencido de interpretar essa provas de maneira totalmente diversa, determinando a soltura dos presos. Afinal, a lei é exatamente a mesma e o suposto crime, igualmente, é o mesmo !
Algo tem que estar errado.
É um delegado que instrui o processo. Como os delegados têm obrigatoriamente que ser bacharéis de direito, será que sua noção das leis diverge tanto da que têm os juízes, prevalecendo sempre o entendimento do juiz ? Não é crível. Ou será que o trabalho dos delegados na instrução do processo é tão superficial a ponto de os juízes terem que, com grande freqüência (em mais de 70% dos casos), determinar a soltura do criminoso ?
Mais: quando o juiz de primeira instância julga o suposto criminoso culpado, um desembargador de segunda instância discrepa. E mais, muitas vezes o desembargador (ou o próprio Tribunal em que esse desembargador atua) mantém a prisão e um ministro de Tribunal Superior concede habeas corpus. Isso, a meu ver, não faz sentido !
Sabe-se que, por ser composta por seres humanos, a justiça, ou seja os juízes de qualquer um dos níveis não estão livres de ser sujeitos a propostas de corrupção. Mas estou convicto de que isso não acontece com a freqüência verificada nos outros poderes ou nos cidadãos em geral. Até porque as remunerações são completamente distintas, diferencial que permite que os juízes não sejam tão tentados a “faturar um extra”.
Diretamente relacionado a esse problema vejo outro, a saber, a freqüência com que determinações da justiça não são cumpridas. Os casos mais freqüentes hoje em dia são os relacionados com movimentos ditos sociais, especialmente os do MST e as invasões/ocupações de propriedades tanto particulares como públicas. Ordens de reintegrações de posse simplesmente são ignoradas, às vezes por vários dias ou mais, período durante o qual os invasores danificam ou destroem bens nas instalações invadidas. Ninguém é preso e condenado, até porque o MST (e seus similares) não tem existência legal.
É inaceitável essa situação que, como mencionei acima, ocorre com propriedades privadas e públicas.
Nenhum de nossos governos recentes, inclusive o atual, tratou do assunto com um mínimo de seriedade. Ao contrário, essas organizações recebem dinheiros de diversos órgãos e de empresas estatais, valores que ascendem a dezenas ou centenas de milhões de reais. Não prestam contas a ninguém.
Em artigos que escreverei mais adiante, abordarei outros assuntos relacionados com a justiça, com nossas leis e com prerrogativas absurdas de que gozam certas classes em nosso País.

Um comentário:

Ralph J. Hofmann disse...

Caro Peter

Por coincidência hoje abordei algo parecido com o teu artigo.
Nós gaúchos (eu adotivo mas criado aqui), sabemos como este estado progrediu em termos de civilização, comparado às histórias de entreveros que, circulando entre Gramado, Canela e Porto Alegre ouviste dos antigos peôes e estancieiros dos Campos de Cima da Serra.
O motorista de meu pai, antigo peão que veio à cidade,nos anos 50 ainda se armava para levar-me de Caxias do Sul a Porto Alegre ao médico.
Era a cultura da violência. A memória dos conflitos.
Isto mudou, mas agora vejo a possibilidade de um retrocesso na civilidade.
Muito bem posto teu artigo.