Há um livro novo na praça (o certo seria dizer mercado) de Nietzsche (foto), belamente traduzido por Flávio Kothe, cujo titulo é “Fragmentos finais”.
Trata-se na verdade de uma coletânea de ensaios curtos, aforismos e poemas, escritos no último período de vida, ainda criativo do filósofo do martelo e que foi recuperado, claro, após sua morte. Kothe nos dá uma primorosa apresentação ou prefácio como queiram, explicando minuciosamente (e partidariamente) o gênio de Nietzsche e toda a incompreensão de que ele foi vítima, ainda em vida.
Mas os “Fragmentos finais” retiram de vez, se ainda alguma dúvida havia, da distância e do repúdio que Nietzsche sentiria em ter seu nome associado ao nazismo, por exemplo, ou mesmo, a qualquer dessas ideologias modernas. Kothe, no prefácio, de quebra ainda mostra como o filósofo foi mal traduzido ao longo do tempo, ele que conhece bem o alemão, da mesma forma que Freud e Marx. Só para termos uma pequena aproximação, um conceito central usado por Marx, como “mais valia”, originado do francês “plus-value”, foi erroneamente traduzido, quando o certo seria “valor a mais” ou “mais valor” algo completamente diferente da já sacralizada “mais valia”. Kothe nos mostra que tudo vale quanto pesa.
Mas nos “Fragmentos”, e sua bela tradução, fica claro que a manjadérrima crítica imposta a Nietzsche em relação à metafísica, ao essencialismo e ao idealismo, ganhou contornos muito mais tórridos do que aquilo que seria o esperado. Outro fato interessante, é por exemplo, a tão propalada misóginia do autor de “Zaratustra”, que através da maioria dos seus biógrafos, era direcionada para todo o feminino, enquanto que Nietzsche criticava a mulher de rebanho, exatamente, como criticava o “homem do rebanho”. Kothe lá para as tantas nos diz: “Nietzsche era um radical defensor da autonomia individual, processo em que as mulheres deveriam estar incluídas”. Kothe não deixa pedra sobre pedra, nessas explicações e correções. É uma lufada de ar límpido e revigorante.
No entanto, o que salta aos olhos para todo aquele que se der ao trabalho de ler as quase 240 páginas, é ver de uma vez por todas, como o filólogo e filósofo abominava nacionalismos de qualquer natureza, o que vai frontalmente de encontro ao nacional socialismo dos nazistas. O livro foi dividido por tópicos, e o primeiro que abre é “Política”, onde já nas primeiras frases lemos o seguinte: “A loucura das nacionalidades e a patetice da patriotada não tem para mim o menor fascínio: ´Alemanha, Alemanha acima de tudo` soa-me dolorosamente nos ouvidos porque, no fundo, eu quero e desejo mais dos alemães”. Ou mais à frente quando o filósofo escreve: “Máxima: não manter relações pessoais com nenhum homem que participe do engodo delírio racista”. Um tapa na cara daqueles que apenas circulavam o autor de “Além do bem e do mal”, como o de alguém ligado sem reservas ao darwinismo.
Sobre o nihilismo, outra acusação clássica a Nietzsche, ele mesmo assim se expressa: “O nihilismo está diante da porta: de onde nos chega esse mais estranho e mais ameaçador de todos os hóspedes?”. O livro segue em tópicos, abordando temas como “filosofia e verdade”, “Vontade”, “Moral”, “Trágico”, passando pela “Estética” até culminar em seus “Poemas e aforismos”.
E foi lendo os “Fragmentos”, por esses dias de política e acordão aqui em Natal para a disputa da prefeitura da capital, que fiquei a me perguntar o que diria o filósofo se aqui morasse. Talvez a resposta estivesse nessas frases: “Com que meios a virtude chega ao poder? Exatamente com os meios de um partido político: difamação, suspeição, sabotagem das virtudes contrárias que já estão no poder, rebatizado do seu nome, perseguição sistemática e calúnia”. E mais ainda: “o que uma ambição faz consigo mesma para se converter em uma virtude? A negação radical dos seus propósitos. A aliança com virtudes vigentes e reconhecidas. A hostilidade declarada contra os adversários delas”. Mais atual impossível. Ou seja, otimistamente, podemos dizer que já chegamos ao século XIX. Já é um avanço.
Mas nos “Fragmentos”, e sua bela tradução, fica claro que a manjadérrima crítica imposta a Nietzsche em relação à metafísica, ao essencialismo e ao idealismo, ganhou contornos muito mais tórridos do que aquilo que seria o esperado. Outro fato interessante, é por exemplo, a tão propalada misóginia do autor de “Zaratustra”, que através da maioria dos seus biógrafos, era direcionada para todo o feminino, enquanto que Nietzsche criticava a mulher de rebanho, exatamente, como criticava o “homem do rebanho”. Kothe lá para as tantas nos diz: “Nietzsche era um radical defensor da autonomia individual, processo em que as mulheres deveriam estar incluídas”. Kothe não deixa pedra sobre pedra, nessas explicações e correções. É uma lufada de ar límpido e revigorante.
No entanto, o que salta aos olhos para todo aquele que se der ao trabalho de ler as quase 240 páginas, é ver de uma vez por todas, como o filólogo e filósofo abominava nacionalismos de qualquer natureza, o que vai frontalmente de encontro ao nacional socialismo dos nazistas. O livro foi dividido por tópicos, e o primeiro que abre é “Política”, onde já nas primeiras frases lemos o seguinte: “A loucura das nacionalidades e a patetice da patriotada não tem para mim o menor fascínio: ´Alemanha, Alemanha acima de tudo` soa-me dolorosamente nos ouvidos porque, no fundo, eu quero e desejo mais dos alemães”. Ou mais à frente quando o filósofo escreve: “Máxima: não manter relações pessoais com nenhum homem que participe do engodo delírio racista”. Um tapa na cara daqueles que apenas circulavam o autor de “Além do bem e do mal”, como o de alguém ligado sem reservas ao darwinismo.
Sobre o nihilismo, outra acusação clássica a Nietzsche, ele mesmo assim se expressa: “O nihilismo está diante da porta: de onde nos chega esse mais estranho e mais ameaçador de todos os hóspedes?”. O livro segue em tópicos, abordando temas como “filosofia e verdade”, “Vontade”, “Moral”, “Trágico”, passando pela “Estética” até culminar em seus “Poemas e aforismos”.
E foi lendo os “Fragmentos”, por esses dias de política e acordão aqui em Natal para a disputa da prefeitura da capital, que fiquei a me perguntar o que diria o filósofo se aqui morasse. Talvez a resposta estivesse nessas frases: “Com que meios a virtude chega ao poder? Exatamente com os meios de um partido político: difamação, suspeição, sabotagem das virtudes contrárias que já estão no poder, rebatizado do seu nome, perseguição sistemática e calúnia”. E mais ainda: “o que uma ambição faz consigo mesma para se converter em uma virtude? A negação radical dos seus propósitos. A aliança com virtudes vigentes e reconhecidas. A hostilidade declarada contra os adversários delas”. Mais atual impossível. Ou seja, otimistamente, podemos dizer que já chegamos ao século XIX. Já é um avanço.
4 comentários:
“A objeção, o desvio, a desconfiança alegre, a vontade de troçar são sinais de saúde: tudo o que é absoluto pertence à patologia.”
“Nietzsche quis ser o grande “desmascarador” de todos os preconceitos e ilusões do gênero humano, aquele que ousa olhar, sem temor, aquilo que se esconde por trás de valores universalmente aceitos, por trás das grandes e pequenas verdades melhor assentadas, por trás dos ideais que serviram de base para a civilização e nortearam o rumo dos acontecimentos históricos. E assim a moral tradicional, e principalmente esboçada por Kant, a religião e a política não são para ele nada mais que máscaras que escondem uma realidade inquietante e ameaçadora, cuja visão é difícil de suportar. A moral seja ela kantiana ou hegeliana, e até a catarse aristotélica são caminhos mais fáceis de serem trilhados para se subtrair à plena visão autêntica da vida.”
Certamente vou ler esse livro, até por acreditar que uma obra póstuma editada por sua irmã, agora já sofre modificações com algo de novo.
Consta que nos últimos anos a irmã, esteve nos braços do nazismo e fez modificações ao interesse do poder da época. Vamos ver.
Como baiano não falo porreta,mas para ecoar eu me rendo de digo:
Porreta... o blog que coloca Nietzsche para análise acende uma luz!
Marreta, vc é porreta, adora seus comentários, vc só poderia ser Baiano, terra de tanta gente boa, povo maravilhoso. Parabéns à vc pelo comentário e ao Giulio pelo artigo.
Alô, Giulio.
Já sei porque o capixaba gosta do Nietzsche. Ele é o filósofo do martelo...
Por isso, 'fragmentos finais'!
Essa não sei explicar,como posso gostar do Rum Havana Club? Como posso gostar de Pyotr Ilyich Tchaikovsky.
Não consigo não gostar do Lago dos Cisnes, da Bela Adormecida e de Quebra Nozes.
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