21 de jul. de 2007

“A Bahia vai bem, obrigado a você”

Por Chico Bruno

No dia 2 de julho de 1969 desembarquei em Salvador. Estava trocando os ares do Rio de Janeiro pelos do Nordeste. A mudança não era por vontade própria, mas pelas contingências políticas da época.
Em 1968, como um dos líderes do movimento dos vestibulandos cariocas havia me envolvido num episódio que não agradou a ditadura. Ao bater boca com o ministro da Educação, Tarso Dutra, coloquei o dedo em riste contra seu rosto. O episódio aconteceu numa reunião no anfiteatro da Reitoria da UFRJ, na Praia Vermelha.
A partir daí minha vida virou um inferno. Fui preso, liberado e passei a ser acompanhado dia e noite pelos órgãos de informações da ditadura. Logo depois do gesto, havia fundado com outros estudantes a famosa Ala dos Estudantes da Portela, cuja sede era em minha casa e da qual fui o primeiro presidente. A ala desfilou pela primeira vez no carnaval de 1969 e trouxe muitos problemas para a escola de samba, pois os milicos queriam que a ala fosse expurgada do desfile pelos dirigentes da escola. Mas, isso é outra história.
O que me leva ao teclado do computador é a troca dos ares cariocas pelos baianos.
Voltando a vaca fria, desembarquei no Aeroporto Dois de Julho e peguei um táxi. O rádio do carro estava ligado e a primeira coisa que ouvi foi um jingle que dizia assim: “A Bahia vai bem, obrigado a você, a Bahia vai bem...”. Era um comercial da Prefeitura do Salvador, administrada por Antônio Carlos Magalhães, nomeado prefeito pelo ditador general Castelo Branco e empossado por ele antecipadamente em 13 de fevereiro de 1967, pois, Castelo desconfiava que seu sucessor, o general Costa e Silva, poderia revogar a nomeação. Por isso, ACM, foi o único prefeito nomeado em 1967, que tomou posse, ainda, com Castelo Branco e não em abril, como os demais, já sob a presidência de Costa e Silva.
Fiquei em Salvador até dezembro de 1969, quando retornei ao Rio de Janeiro, imaginava que os milicos haviam se esquecido de mim. Ledo engano. Por isso, em janeiro de 1970 fui parar em Fortaleza, onde consegui voltar ao jornalismo, nos Diários e Emissoras Associados do Ceará, atuando como repórter especial em área compreendida entre o Acre e a Bahia.
É aí, que conheço ACM. De quem guardo a lembrança do primeiro contato, pois é um momento, que por um pequeno detalhe, se desnuda a personalidade do político baiano.
Corria algum ano dos anos 70. Não me lembro qual. Apenas me lembro, que estávamos na varanda do apartamento de ACM, na rua Euclides da Cunha, no bairro da Graça, em Salvador, eu, repórter do Correio do Ceará, Césio Oliveira, do Estadão e Renato Pinheiro, de O Globo. Aguardávamos ACM, governador da Bahia, para entrevista-lo para os nossos jornais.
ACM havia sido condecorado pela Câmara Municipal de Salvador, antes de deixar a Prefeitura, com o título de “Prefeito do Século”, pois havia mudado radicalmente o perfil da cidade, rasgando avenidas de vale e acabando com a invasão de terrenos a beira-mar, ocupados por membros da elite baiana de forma ilegal. Por isso, despertava a curiosidade da imprensa sobre o quais seriam seus planos para o estado.
Em dado momento, dona Arlete, mulher de ACM, se aproxima e nos pergunta se queríamos um suco, justo quando ACM se aproxima de nós. Antes mesmo de nos cumprimentar, ele alerta sua mulher com a seguinte frase:
"Arlete, jornalista não gosta de suco, gosta de uísque. Traga um Chivas".
Esta frase ficou marcada em minha memória, pois demonstrou que o papo ia longe e sem nenhuma aresta. E foi o que aconteceu. Foi uma das melhores entrevistas que fiz em mais de 40 anos de profissão.

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